Categoria: Produtividade

Por Marcos Marinho 

Nos dias atuais, é relativamente comum ouvir de pessoas próximas que se afirmam serem “multitarefas”. Acreditam que são capazes de realizar várias atividades ao mesmo tempo, como responder e-mails enquanto participam de uma reunião ou checam as notificações do smartphone enquanto conversam com alguém. No entanto, alguns estudos têm mostrado que, na realidade, a multitarefa é uma ilusão e que nossa capacidade de concentração e desempenho é severamente comprometida quando tentamos realizar várias tarefas simultaneamente. 

Neste artigo, vamos explorar a ilusão da multitarefa e seus impactos negativos no trabalho e vida pessoal. 

Razões que explicam por que a ideia de que podemos ser multitarefa prosperou  

A ideia de que podemos ser multitarefa prosperou em parte devido ao avanço tecnológico. A tecnologia nos permite ter acesso constante a informações e fazer várias coisas ao mesmo tempo, como responder e-mails enquanto assistimos a uma reunião virtual ou checar nossas redes sociais enquanto estamos esperando em uma fila. Além disso, o mercado de trabalho valoriza a eficiência e a produtividade, o que leva muitas pessoas a acreditar que ser multitarefa é uma habilidade desejável.  

O que muitas vezes chamamos de multitarefa, na verdade, é uma alternância rápida entre tarefas. Essa alternância prejudica nossa capacidade de lembrar onde paramos e o que estávamos fazendo, na verdade, fazer malabarismos entre tarefas nos torna menos criativos e mais propensos a erros, comprometendo a qualidade do nosso trabalho. 

Como consequência a ilusão da multitarefa pode levar a um aumento no estresse, fadiga e diminuição da qualidade do trabalho realizado. É importante reconhecer que a capacidade de se concentrar em uma única tarefa é uma habilidade valiosa e que devemos nos esforçar para melhorar a qualidade da nossa atenção e foco.   

2 estudos de neurocientistas que comprovam a impossibilidade de realizarmos multitarefas efetivamente. 

Em um estudo publicado na revista científica “Proceedings of the National Academy of Sciences”, os neurocientistas René Marois e J. David Jentsch demonstraram que, quando tentamos realizar duas tarefas simultaneamente, nosso cérebro divide a atenção entre elas, reduzindo a eficiência no desempenho de ambas. Além disso, eles observaram que a alternância entre tarefas exigia tempo e recursos cognitivos adicionais, o que levava a um atraso na realização das atividades. 

Outro estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Stanford e publicado no periódico “PLOS ONE” demonstrou que a multitarefa pode afetar negativamente a memória de curto prazo. Os participantes do estudo que tentaram realizar várias tarefas ao mesmo tempo apresentaram pior desempenho em um teste de memória do que aqueles que se concentraram em uma única tarefa. Os resultados indicaram que a multitarefa pode afetar a capacidade do cérebro de filtrar informações irrelevantes, o que pode comprometer a qualidade do trabalho realizado. 

Situações em que a crença na capacidade multitarefa pode nos criar problemas. 

Imaginemos a seguinte situação: uma jovem profissional, chamada Ana, está em uma reunião importante com seus colegas de trabalho e seu chefe. Ela precisa apresentar um relatório que preparou, mas ao mesmo tempo está tentando responder mensagens em seu celular e verificar seus e-mails. Em um momento de descuido, Ana sem querer envia uma mensagem pessoal para o grupo da reunião ao invés de para um amigo, em que ela reclama sobre como a reunião está sendo chata e entediante. Constrangida, ela tenta se desculpar, mas já é tarde demais, a gafe já foi cometida.  

Esse lapso de Ana mostra como a multitarefa pode nos colocar em situações embaraçosas e prejudicar a nossa reputação profissional. É importante lembrar que, em algumas situações, é melhor desligar o celular ou esperar para responder e-mails para evitar distrações e erros. 

Suponha que a mesma jovem profissional, Ana, tenha uma grande quantidade de tarefas para realizar em um dia no escritório. Ela precisa finalizar um relatório importante, preparar uma apresentação para uma reunião no final do dia e responder a várias mensagens em seu celular. No entanto, ao tentar realizar tudo ao mesmo tempo, ela comete um erro no relatório que passa despercebido por ela e é enviado para o cliente.  

O cliente percebe o erro e, como resultado, a empresa precisa gastar tempo e recursos para corrigir o erro e lidar com as consequências do problema. Essa situação mostra como a multitarefa pode levar a erros e prejuízos financeiros para uma empresa, além de comprometer a qualidade do trabalho realizado. 

Riscos de Acidentes e o retorno a monotarefa. 

David Strayer, professor da Universidade de Utah e pesquisador pioneiro no estudo da forma como os cérebros lidam com as tarefas, destaca a importância de voltarmos à monotarefa, realizando uma única coisa de cada vez. Ele ressalta que é essencial nos livrarmos de distrações, como nossos telefones e notificações, que não apenas nos perturbam, mas também despertam o desejo por interrupções.  

Além disso, em seus estudos, Strayer coloca os participantes em simuladores de condução, observando que quando eles falam ao telefone, o tempo de reação do freio diminui e há aumento de colisões com outros carros. Observamos isto cotidianamente em nosso trânsito com pessoas dirigindo seus automóveis e respondendo mensagens em seus celulares e smartphones.  

Algumas exceções e a ilusão “supertaskers” 

O Dr. Strayer identifica exceções conhecidas como “supertaskers”. Esses indivíduos, que representam aproximadamente 2,5% da população, incluem chefs de alto nível, pilotos de caça e atletas profissionais.  

Eles têm a capacidade de processar múltiplos fluxos de informações simultaneamente e manter tudo organizado. No entanto, é importante ressaltar que muitas vezes um número significativamente maior de pessoas acredita serem supertarefas, aproximadamente 20 vezes mais do que a estimativa real. 

5 sugestões de como evitar cair em comportamentos multitarefa no trabalho 

Bom, se compreendermos que provavelmente não estamos nessa faixa dos 2,5% estimados pelo Dr. Strayer, precisaremos adotar algumas estratégias para não cairmos na armadilha multitarefa. Aqui estão cinco sugestões para evitar cair em comportamentos multitarefa no trabalho: 

• Defina prioridades: antes de começar o trabalho, é importante identificar as tarefas mais importantes e urgentes e se concentrar nelas. Isso ajudará a evitar a tentação de realizar várias tarefas ao mesmo tempo. 

• Desligue as notificações: muitas vezes, as notificações de e-mails, mensagens e redes sociais podem ser uma grande distração. Desligar as notificações pode ajudar a minimizar as interrupções e permitir que você se concentre em uma tarefa de cada vez. 

• Estabeleça limites de tempo: estabelecer limites de tempo para as tarefas pode ajudar a manter o foco e evitar distrações. Por exemplo, dedicar 30 minutos a uma tarefa específica antes de passar para a próxima pode ajudar a manter o ritmo sem prejudicar a qualidade do trabalho. 

• Aprenda a dizer “não”: muitas vezes, a multitarefa ocorre porque nos comprometemos a fazer mais do que podemos lidar. Aprender a dizer “não” a tarefas ou projetos extras pode ajudar a evitar a sobrecarga de trabalho e a tentação de realizar várias tarefas ao mesmo tempo. 

• Pratique a atenção plena: a atenção plena pode ajudar a melhorar a concentração e a produtividade. Praticar a atenção plena por alguns minutos por dia pode ajudar a reduzir a distração e a impulsividade, o que pode levar a uma maior eficiência no trabalho. 

Em conclusão, a multitarefa é frequentemente apresentada como uma habilidade valiosa e indispensável no mundo moderno, muitas vezes constando como habilidade exigida em processos seletivos em empresas, mas o que estudos vem demonstrando que, na realidade, a multitarefa pode prejudicar a produtividade e a qualidade do trabalho.  

É importante lembrar que a verdadeira eficiência vem da concentração em uma tarefa de cada vez e da priorização de tarefas. Ao evitar a multitarefa e focar na tarefa em questão, podemos alcançar um nível mais elevado de realização e qualidade no trabalho. Em outras palavras, a simplicidade e a concentração podem levar a resultados mais satisfatórios do que a tentativa de realizar várias tarefas ao mesmo tempo. 

Dica de leitura 

Uma sugestão de livro que aborda a questão da multitarefa é “A Arte de Fazer Acontecer: Método GTD – Getting Things Done” de David Allen.

Embora o livro não trate especificamente da multitarefa, ele apresenta uma abordagem holística para gerenciamento de tarefas e priorização, que pode ajudar a minimizar a tentação de realizar várias tarefas simultaneamente. A edição em português do livro foi traduzida e publicada pela editora Sextante.